No regresso aos debates quinzenais no Parlamento, a semana passada, após o interregno forçado pela saga do Orçamento do Estado, o primeiro-ministro escolheu falar dos resultados obtidos pelos alunos portugueses de 15 anos, nos testes organizados pelo PISA (Programme for International Student Assessment). É impossível escamotear: foram resultados muito positivos. Pela primeira vez, alcançámos a média da tabela dos países da OCDE no que respeita à literacia da leitura e subimos, consideravelmente, em disciplinas como a Matemática e as Ciências. Em tempo de vacas magras e em que a catadupa de notícias negativas é a regra, nada melhor do que um presente destes para animar as hostes. Só é pena que José Sócrates seja tão previsível e não tenha tido a ousadia de levar ao hemiciclo um outro tema não menos importante e para o qual se exigem soluções urgentes e combate igualmente vigoroso: a corrupção. Curiosamente, uma outra instituição estrangeira, a Transparência Internacional, divulgou, também na semana passada, o Barómetro Global da Corrupção, de que Portugal não sai nada bem. Piorámos em vários aspetos, como no índice de transparência, mas o que impressiona é a perceção que os portugueses têm sobre a evolução do fenómeno. Face a 2007, 75% dos inquiridos no estudo acham que a luta contra o fenómeno é ineficaz e 83% pensam que a corrupção aumentou, nos últimos três anos. Partidos, Parlamento e setor privado são tidos como os mais corruptos, sendo que, basicamente, a maioria dos portugueses acredita que os principais corruptores se situam no setor privado e que os corrompidos fazem parte do setor público.
Tem-se feito muito pouco para resolver este problema. O PS de Sócrates revelou-se, de resto, muito timorato na elaboração da última legislação aprovada, com as propostas mais avançadas e notoriamente mais eficazes de João Cravinho, defendidas por um restrito grupo da ala mais à esquerda, a serem derrotadas em toda a linha, depois de muitos contorcionismos e episódios pouco edificantes, na bancada socialista. Também o Presidente da República acabou de promulgar a nova Lei de Financiamento dos Partidos, um diploma muito pouco claro em aspetos cruciais como "a transparência e controlo" (palavras dele) dos dinheiros privados que entram nos cofres partidários. Cavaco Silva vetou, em junho de 2009, a anterior proposta, mas, sem se perceber porquê, deixou agora passar a nova versão, à qual prodigalizou numerosas críticas, em mensagem ao Parlamento. Ou seja, o Presidente subscreveu a lei, apesar de ele próprio considerar que se mantém o essencial dos problemas que, antes, justificaram o veto. Ao deixar passar esta lei, o PR defraudou todos os que, no terreno, se empenham na luta contra a corrupção.
Um dos aspetos que chama a atenção neste diploma é a falta de clareza na forma como está escrito. É a velha questão subjacente a códigos e legislação avulsa: as leis não são percetíveis pelos cidadãos, estão propositadamente formuladas para permitirem interpretações e escapatórias a quem as quer violar. São uma estrada aberta para a corrupção, pois a sua opacidade propicia caminhos ínvios, como seja a introdução discreta de pontuação que lhe altera o sentido inicial. Quem não se lembra do famoso "caso da vírgula", passado nos anos noventa? E ainda no ano passado houve uma pequena tempestade justamente por causa da Lei do Financiamento dos Partidos, à qual cirurgicamente alguém surripiou duas palavrinhas, no meio do diploma do Orçamento do Estado. Descobriu-se a tempo e as palavrinhas foram repostas, mas nunca se soube quem foi. Nem no "caso da vírgula".
Ora, o Governo, se tiver vontade política, pode alterar este estado de coisas. Legislação clara e transparente precisa-se... com caráter de urgência. E, quem sabe, talvez surjam resultados positivos para Sócrates exibir no Parlamento. Desta vez, em matéria de corrupção.
Tem-se feito muito pouco para resolver este problema. O PS de Sócrates revelou-se, de resto, muito timorato na elaboração da última legislação aprovada, com as propostas mais avançadas e notoriamente mais eficazes de João Cravinho, defendidas por um restrito grupo da ala mais à esquerda, a serem derrotadas em toda a linha, depois de muitos contorcionismos e episódios pouco edificantes, na bancada socialista. Também o Presidente da República acabou de promulgar a nova Lei de Financiamento dos Partidos, um diploma muito pouco claro em aspetos cruciais como "a transparência e controlo" (palavras dele) dos dinheiros privados que entram nos cofres partidários. Cavaco Silva vetou, em junho de 2009, a anterior proposta, mas, sem se perceber porquê, deixou agora passar a nova versão, à qual prodigalizou numerosas críticas, em mensagem ao Parlamento. Ou seja, o Presidente subscreveu a lei, apesar de ele próprio considerar que se mantém o essencial dos problemas que, antes, justificaram o veto. Ao deixar passar esta lei, o PR defraudou todos os que, no terreno, se empenham na luta contra a corrupção.
Um dos aspetos que chama a atenção neste diploma é a falta de clareza na forma como está escrito. É a velha questão subjacente a códigos e legislação avulsa: as leis não são percetíveis pelos cidadãos, estão propositadamente formuladas para permitirem interpretações e escapatórias a quem as quer violar. São uma estrada aberta para a corrupção, pois a sua opacidade propicia caminhos ínvios, como seja a introdução discreta de pontuação que lhe altera o sentido inicial. Quem não se lembra do famoso "caso da vírgula", passado nos anos noventa? E ainda no ano passado houve uma pequena tempestade justamente por causa da Lei do Financiamento dos Partidos, à qual cirurgicamente alguém surripiou duas palavrinhas, no meio do diploma do Orçamento do Estado. Descobriu-se a tempo e as palavrinhas foram repostas, mas nunca se soube quem foi. Nem no "caso da vírgula".
Ora, o Governo, se tiver vontade política, pode alterar este estado de coisas. Legislação clara e transparente precisa-se... com caráter de urgência. E, quem sabe, talvez surjam resultados positivos para Sócrates exibir no Parlamento. Desta vez, em matéria de corrupção.
Fonte - Visão
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