As velhas teses funcionalistas, que tinham a corrupção como ‘um mal necessário do mercado’, têm vindo a ser superadas. Repete-se agora, nas convenções da ONU e no Conselho da Europa, a ideia de que a corrupção perverte o mercado, mina as instituições e os valores da democracia, acentua as desigualdades sociais e agrava o empobrecimento dos mais frágeis.
Estes instrumentos têm como denominador comum sistemas eficazes, proporcionais e dissuasores, fundados quer em leis de repressão adequadas quer em normas e práticas preventivas relevantes.
O que não sucede em sistemas, como o nosso, em que uma extremada preocupação garantística facilmente descamba em inoperância e impunidade. A justiça confronta-se com tais dificuldades, que houve já quem comparasse a sua tarefa à de apanha de pulgas com luvas de boxe.
O seu elenco faz-se num ápice: a excêntrica entorse da publicidade imposta à investigação pela reforma penal de 2007, penas excessivamente leves com o correspondente estreitamento dos prazos de prescrição, especialmente nos crimes de corrupção para acto lícito e, para piorar as coisas, a opção por soluções de incompreensível benignidade, como o regime tendencial de suspensão de penas inferiores a cinco anos de prisão e a possibilidade de, em casos de penas de prisão não superiores a três anos, aplicadas a titulares de cargos políticos e a funcionários públicos ou equiparados, o tribunal as substituir por proibição temporária do exercício de funções.
Como se tanto não bastasse, somam-se hipóteses de empastelamento do processo, quer pela utilização dilatória da fase de instrução, quer em virtude de plúrimos recursos de efeito suspensivo, quer porque se deixou instalar um clima de insegurança jurídica mercê da falta de prévia verificação da constitucionalidade de muitas das normas (aliás, de duvidosa qualidade técnica) mais recentemente produzidas.
Para piorar ocorrem, a par da carência de meios, situações de insuficiência de especialização na investigação, na direcção do inquérito, instrução e realização do julgamento. O que acarreta resultados devastadores para o eficaz funcionamento do sistema repressivo, já que procuradores e juízes abstêm-se quando deviam aprofundar investigações ou acusar, despronunciam quando deviam pronunciar ou absolvem quando deviam condenar, abrigando-se à sombra do princípio ‘in dubio’ ao primeiro assomo de incompreensão. Por outro lado, são anémicos os resultados do confisco de produtos do crime, que uma qualquer força atávica e oculta impede de frutificar.
Mantém-se actual, portanto, o quadro que, com peculiar chiste, Maria Rattazzi (in ‘Portugal de relance’) traçava da nossa justiça, em finais do século XIX: “A aplicação da lei em Portugal é rápida e inexorável para os pobres, modificando-se sensivelmente quando se trata de burgueses abastados; e completamente, a ponto de não exercer o seu predomínio senão constrangida, sempre que se dirige a pessoas de elevada condição.”
Estes instrumentos têm como denominador comum sistemas eficazes, proporcionais e dissuasores, fundados quer em leis de repressão adequadas quer em normas e práticas preventivas relevantes.
O que não sucede em sistemas, como o nosso, em que uma extremada preocupação garantística facilmente descamba em inoperância e impunidade. A justiça confronta-se com tais dificuldades, que houve já quem comparasse a sua tarefa à de apanha de pulgas com luvas de boxe.
O seu elenco faz-se num ápice: a excêntrica entorse da publicidade imposta à investigação pela reforma penal de 2007, penas excessivamente leves com o correspondente estreitamento dos prazos de prescrição, especialmente nos crimes de corrupção para acto lícito e, para piorar as coisas, a opção por soluções de incompreensível benignidade, como o regime tendencial de suspensão de penas inferiores a cinco anos de prisão e a possibilidade de, em casos de penas de prisão não superiores a três anos, aplicadas a titulares de cargos políticos e a funcionários públicos ou equiparados, o tribunal as substituir por proibição temporária do exercício de funções.
Como se tanto não bastasse, somam-se hipóteses de empastelamento do processo, quer pela utilização dilatória da fase de instrução, quer em virtude de plúrimos recursos de efeito suspensivo, quer porque se deixou instalar um clima de insegurança jurídica mercê da falta de prévia verificação da constitucionalidade de muitas das normas (aliás, de duvidosa qualidade técnica) mais recentemente produzidas.
Para piorar ocorrem, a par da carência de meios, situações de insuficiência de especialização na investigação, na direcção do inquérito, instrução e realização do julgamento. O que acarreta resultados devastadores para o eficaz funcionamento do sistema repressivo, já que procuradores e juízes abstêm-se quando deviam aprofundar investigações ou acusar, despronunciam quando deviam pronunciar ou absolvem quando deviam condenar, abrigando-se à sombra do princípio ‘in dubio’ ao primeiro assomo de incompreensão. Por outro lado, são anémicos os resultados do confisco de produtos do crime, que uma qualquer força atávica e oculta impede de frutificar.
Mantém-se actual, portanto, o quadro que, com peculiar chiste, Maria Rattazzi (in ‘Portugal de relance’) traçava da nossa justiça, em finais do século XIX: “A aplicação da lei em Portugal é rápida e inexorável para os pobres, modificando-se sensivelmente quando se trata de burgueses abastados; e completamente, a ponto de não exercer o seu predomínio senão constrangida, sempre que se dirige a pessoas de elevada condição.”
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